sábado, 31 de dezembro de 2022

Estou aprendendo a encontrar conforto na minha própria pele
O que não significa contentamento diário, pelo contrário
Alguns poços escuros eu me forcei a limpar
Para liberar espaço aqui dentro 
Para deixar a luz entrar

Significa que estou aprendendo a desapegar
A lidar com bagagens pesadas e a deixá-las pra trás
Significa que estou aprendendo a ser paciente
A sair do meu centro e voltar correndo para o meu lugar

Estou aprendendo a me ouvir mais
Eu, que vivo pelo que escrevo, entendo que muitas vezes preciso calar
Dar tempo ao tempo
Deixar tudo decantar
Respeitando os meus silêncios e vazios
Para fazer das palavras veículo
Que me conduz exatamente para onde eu deveria estar

Estou sendo dentro do possível
A cada dia me pareço mais comigo
E se hoje eu sei mais sobre mim
É porque deixei muitas certezas no caminho










sábado, 24 de dezembro de 2022

Desci, sozinha, coisa que nunca faço 
Procurei um lugar em que o sol me abraçasse por inteiro
Lagarteei
Passei um bom tempo apenas encarando o céu límpido
As folhas dos coqueiros dançando com o vento frio
Poderia dizer que o dia está lindo
Me parece pouco
São por esses momentos triviais que vale a vida

Refleti em meio à beleza:
É no silêncio que as palavras me acham
É os momentos em que estou mais distraída
Que eu me entrego à poesia

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Hoje escutei uma música inédita
E, por tamanha beleza, não consegui me conter
Talvez seja apenas disso que eu precise para viver
Essa certeza
De que ao ler cada palavra dita
Ao ouvir cada rima e melodia
Só por falar de amor
Vou pensar em você

(Ouvindo Songbird)

quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Estou só
Há muito não ouço nenhuma voz
Apenas o silêncio das luzes apagadas
A mudez das portas fechadas

Estou só
Meus pés transitam pela sala
Minhas mãos tateiam meu rosto
Esfregam meus olhos 
Só para me asegurar de que ainda estou aqui

Estou só
Não há mais nada
Nada além desse imenso vazio a me consumir



quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Escrevo pouco sobre você.
Sobre a gente.
Estamos vivendo esse platô do amor há tanto tempo que as palavras muitas vezes me escapam.
Porque me rendo à poesia da rotina.
Acordar antes de você, escutar a sua respiração, me alegrar quando ouço seus passos. 
A pausa que você faz, me entreolhando, só para tirar de mim um dos muitos sorrisos do meu dia.
Parar o que estou fazendo, a qualquer tempo, só para te abraçar.
Às vezes, nem te espero chegar. Te invado e te inundo de beijos, mesmo quando você ainda está sonolento...

E esses são apenas os nossos primeiros minutos...

Te flagro enquanto trabalho. Olho para você, tão distraído, e me distraio.
Quero saber o que você está assistindo. Peço para que aumente o volume, só para dividir mais esse momento contigo.

E nos alternamos para fazer o café da manhã.

Depois do fim do meu trabalho, corro logo pro seu lado, para aproveitar mais um pouco antes da sua saída.
Às vezes, nem falo nada.
Aquela paz de saber que você está ali.
Porque tudo fica vazio no segundo em que você atravessa a porta.
Tudo é nada quando você não está aqui.

Parece loucura me sentir assim. 
Uma década de amor que não se esgota, que permanece, que se renova.
Entre erros e acertos.
Entre conquistas e perdas.
Entre sorrisos e lágrimas.

É a esperança que eu tenho ao dormir, sabendo que ao acordar é você quem eu vou encontrar.
É o sono reparador que eu só tenho quando me aninho no seu peito.
É assistir a Vale Tudo ou a uma partida do Flamengo.
São as pequenas grandes coisas que me dão sentido.
Para recomeçar.
Para agradecer todos os dias.

Porque amar você é o meu propósito de vida.




quarta-feira, 9 de novembro de 2022

O nome dela é Gal



"Eu vou fazer uma canção pra ela, uma canção singela, brasileira..."


A sua voz sagrada é minha trilha
Rememora lembranças de um passado que sequer vivi, mas é tão palpável que me toca profundamente
E se faz presente na nostalgia
Ao mesmo tempo, me traz imagens do futuro
Como quando escuto:

"Comigo vai tudo azul
Contigo vai tudo em paz
Vivemos na melhor cidade, da América do Sul, da América do Sul.."

Desenhei um sonho com esse som
O meu Rio, num fim de tarde, à beira da paisagem
Na praia cujas dunas tem a sua digital
Gal

Poesia que transcende as palavras
Que mora no olhar expressivo
No respeito às lágrimas, 
Mas ainda mais à risada
No seu signo
Na flor que encontrou no seu cabelo abrigo

Recuso o silêncio do luto
Nada se perdeu porque não ficou mudo
Ecoa eterno, infinito
Não apenas te escuto
Eu sinto.


"Lágrimas negras
Caem, saem, doem
São como pedras de moinho
Que moem, roem, moem
E você baby vai..."












sábado, 5 de novembro de 2022

Há 4 anos eu estava desolada. Lembro até hoje da sensação de impotência, do sentimento de dissociação, como se tudo ao redor fosse imaginário, pois o que estava acontecendo à minha volta parecia impossível. Um pesadelo sem igual.

E chegou domingo. Dia 30, aniversário de Amandinha.
E toda a frustração, raiva, luto e desesperança deram lugar a uma luz que até então parecia esmaecida.
Uma centelha.
Que ficou mais forte, vibrante, vermelha.

Aos poucos, todo o cinza desses dias foi tomando cor, criando vida.

Senti a tristeza ser expurgada do meu corpo, que foi inundado de alegria genuína.

Eu me senti, novamente, pertencente a um país que rejeita a violência e a mentira.

E que acredita num futuro próspero, amoroso, diverso e humano. Que torce, que se comove, que vibra.

Um Brasil, então sufocado, que enfim respira aliviado.

Um Brasil que inspira.







quinta-feira, 8 de setembro de 2022

Os meus afetos nunca exigiram presença. Não poderia ser de outro jeito, já que a vida é transformação constante e mudar se tornou praticamente rotina na minha vida. De casa a cidade, de estado a país. E eles, os afetos, permaneceram. Vínculos mais antigos, atuantes há mais de 20 anos, e vínculos que criei há menos de 2 anos. Não dá para medir esses laços. Não é possível desatá-los.
Posso dizer que sou uma pessoa adaptável. Tudo tem um tempo bem peculiar comigo e essa é uma das coisas que sigo aprendendo: os afetos que importam fi(n)cam. No coração, no caminho. E não há distância nem tempo capazes de mudar isso.

Hoje fiquei mais saudosa, obviamente.
Meu ascendente em aquário vibra no coletivo.
Mas tudo o que recebi só reforça o que sinto: tenho todas as pessoas que amo bem aqui, junto comigo.

É por causa delas que há 32 anos eu (r) existo.

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Retalhos da pandemia

Passei a percebê-lo. Algo tão corriqueiro, apenas nos damos conta de sua importância quando o perdemos. Agora, sinto o quente que ponho pra fora e que embaça meus óculos. Sinto porque paro para observar. 
Inspiro, expiro. 
No meio da crise, reaprendi a respirar. 

*

Máscara fora de época, sem fantasias. Não é disfarce, mas proteção. 
E o que nos resta é encarar o novo mundo com menos sorrisos, com palavras meio abafadas, com mais atenção. Um universo de sentidos que mora no olhar. 
Olhar e ver. Olhar e entender. Olhar e aprender. Olhar e transformar. 

(Textos escritos em meio à quarentena - maio/2020)




Às vezes, me pego pensando se ainda consigo escrever. Elaborar os sentimentos e arranjá-los de um jeito que só eu entenda de verdade, mas que alcance quem (ainda?) me lê.

Tudo é tão rápido. E eu sinto falta de um momento anterior, em que eu era capaz de olhar para dentro com total honestidade, sem rodeios, sem medo.
Porque escrever era, de certa forma, o meu grito de independência. Nada me continha. Eu transbordava.

De vez em quando revisito meus textos. A transparência ainda me assusta. Mas o tempo passa e a gente endurece, ainda que haja aquele ínpeto de procurar a beleza por meio do olhar.

Tem sido raro. A última vez foi assistindo a um documentário no canal Curta. Num ímpeto, pensei: era assim que eu queria viver. Traçando paralelos entre obras literárias, escavando entrelinhas e subtextos, vivendo de palavras. 

Viver de palavras. 
Parece utopia, não é?
Durante muito tempo fiz delas meu amparo, minha estrada.

Preciso voltar para casa.
Por que escrever?
Talvez seja uma pergunta que eu não saiba responder.
Sentir é um hábito. 
Dar vida às palavras é um parto. Tempo para conceber, maturar e trazer à luz.
Difícil. Doloroso, muitas vezes. 

Nos últimos anos, estive no lugar do escapismo, deixando tudo arder, sem me conter, sem refúgio.
Escrever é água de beber, de matar sede. Eu estava no deserto, atravessando a aridez.

Porque a vida só é fecunda com as palavras.

E a chuva sempre vem.



quinta-feira, 21 de julho de 2022

Gente que sabe o que quer e que diz a que veio
Gente que é 8 ou 80, sem meio termo
Que não se conforma com a borda
E nem é pela metade
Porque sabe que a sua melhor parte
É ser quem se é por inteiro
Há tanto acontecendo. E quase tudo é reflexo dos processos que experimento.
Desbravo quem sou por dentro, buscando me acolher por inteiro.
Nada será como antes.
Não sou a mesma pessoa que fui ontem. 
E espero ser alguém melhor a cada instante.
Reavalio minhas rotas, refaço minha trajetória. 
Desaprendo, reaprendo, recomeço. 
Compreendo cada caminho que trilhei. 
Sem culpa, sem remorso, sem medo.

A vida é um risco que precisamos correr.

E não temos tempo a perder.


Li sobre as palavras não serem território, mas um lugar para onde voltamos, de vez em quando. Achei bonito.
Pensei sobre isso.
A escrita já não é mais o meu lugar fixo. 
E por mais triste que possa parecer, sinto que esse sempre foi o destino:
A liberdade. 
Minha e das palavras.
Sem exigências, sem forçar a barra.

E aí, quando um texto acontece, eis o encantamento
Porque escrever é uma espécie de mágica.



quarta-feira, 20 de julho de 2022

Quantas risadas cabem numa lembrança?
Quanta história carrega uma memória?
É impossível medir a intensidade da alegria sentida por meio das fotografias.
É porque os abraços não atravessam as telas.
E as palavras são diferentes quando ditas na ausência.
As músicas que eu escuto não soam a mesmas quando estou sem eles.
Como explicar?
Como mensurar?

Eles realmente me conhecem
Do pior ao meu melhor, entre quedas e quebras, erros e acertos
E me amam assim mesmo porque me respeitam e me aceitam
Que milagre é ter um amigo
Que privilégio é saber que eles estão aqui comigo

Há 2, 5, 10, 20 anos...
Essa é uma das coisas de que eu mais me orgulho
Eu tenho os melhores amigos do mundo.

sábado, 25 de junho de 2022

Sempre tive medo de falar que sou escritora.
A escrita é, para mim, um ofício tão sagrado, que sempre carreguei comigo o receio de maculá-lo.
Não soa um pouco prepotente?
Talvez a questão seja o comprometimento com essa escolha.
Bater no peito, sem falsa modéstia, e assumir que escrever talvez seja uma das poucas coisas que realmente me dá prazer.
As palavras sempre foram o minha forma de entender.
Porque esse é o meu olhar. Sempre foi. Meu jeito de contemplar, de me conhecer, de ressignificar.

Apenas escrevendo eu enxergo propósito, sentido em ser.
Na escrita eu encontrei o meu lugar

domingo, 19 de junho de 2022

Manaus


Não foi amor à primeira vista. Precisei de mais tempo, como tudo na minha vida. Maturei o meu olhar, passei a arriscar alguns passos além das quatros paredes que encerravam meu quarto. Tudo para ver o sol se pôr. Colecionava esses registros diariamente, aos poucos fui me sentindo integrada à cidade que eu quase desconhecia (e rejeitava), porque apenas a enxergava sob uma perspectiva.
Eu me permiti mudar a ótica e construir novas memórias. 
O legado: muitas lembranças e histórias.

E aqui, num outro país, a gente tende a fazer comparações, a enxergar muitas diferenças, mas hoje não quero me ater a elas.

Porque eu sinto falta de pupunha, de beber cerveja no Largo, de andar pelo centro, dos bares, dos flutuantes, de decidir, num rompante, ir para Presidente Figueiredo.

Sinto saudade da varanda de casa, dos meus amigos, das noites sem fim, das manhãs de chuva, dos domingos de sol, de morrer de medo de entrar num barquinho, mas correr o risco só pelo privilégio de estar à beira da paisagem, contemplando a imensidão do rio.

Sou carioca, meu sotaque me denuncia onde quer que eu vá.

Eu, que durante muito tempo quis ir embora, consigo enxergar toda a beleza daquele lugar.


Coisas que a gente só percebe quando se sente pertencente.
Coisas que só a saudade aprimora.

Porque fiz de Manaus o meu lar.

terça-feira, 24 de maio de 2022

Quanto de eternidade cabe na nossa vida
O silêncio cortado pelo vento
A dança das folhas irrompendo as cortinas
E o amor ao lado
Dois corpos cansados
Exaustos do que foi consumado

Lembro do dia em que a noite parecia infinita
E o rio, calmo, na sua imensidão de mar
Nenhuma luz acesa
Só estrelas para iluminar
E eu sabia que aquilo que eu via
Iria se eternizar

Quanto de para sempre cabe nos nossos dias
A nossa retina só registra
O que a memória insiste em lembrar
A gente sabe,
A gente sempre sabe, na hora exata, o que foi feito pra durar

segunda-feira, 16 de maio de 2022

Setting sun
Full moon rising
The city filled with lights
Butterflies passing by
I see magic all around
Energy that shows through my eyes
My hair dances along the wind
The one I love is by my side

Alive:
That's how happiness feels like

quinta-feira, 5 de maio de 2022

Os últimos raios de sol anunciando a noite
Um desejo de boa sorte
Chá de capim limão

Vento balançando as folhas das palmeiras
Comida pronta na geladeira
Sinais verdes

Prazos finalizados antes do almoço
O abraço dele me envolvendo durante o sono
Banho quente

Cabelo um dia depois de lavado
Dormir assistindo a um seriado
Não fumar cigarro há seis meses

O quinto dia útil trazendo o salário
Todo e qualquer feriado
O Nordeste

Pés descalços depois de andar de salto
Ser elogiada por um bom trabalho
Rir escandalosamente

Casa com piscina na Vivenda
Música dos anos 80
Amigos presentes

Encontrar a rima que eu precisava
Fazer mágica com as palavras:
Enxergar poesia em todos os prazeres

(obrigada, Brecht)



sexta-feira, 8 de abril de 2022

Há belezas que só o deserto permite.
A vastidão de areia e azul, o vento lapidando as pedras, dando forma e cor a cada uma delas.
A vegetação brava
Brava porque resiste.
O sol que ilumina e arde.
Pequenos oásis, montanhas, trilhas.
O corpo que desafia a subida porque acredita que o esforço vale a vista.
Lá de cima o silêncio compõe uma sinfonia.
As palavras sequer alcançam a paisagem.

A terra em estado bruto
Em estado de arte.

Isso também é poesia.





domingo, 27 de março de 2022

"Quem é que já foi bebê aqui? Quem é que já foi uma criança pequenininha?" 

Aos 8 anos escutei Legião Urbana pela primeira vez. Achei uma relíquia: uma fita cassete com algumas músicas do As Quatro Estações. 

Há Tempos era a primeira. 

Por óbvio, à época não entendia bem uma letra que começava com "Parece coca1n4, mas é só tristeza..." 

Mais pra frente eu entenderia. 

Ouvia a fita quase todos os dias. Se fiquei esperando meu amor passar era a preferida. Fazia catequese e de alguma forma aquele final me comovia. 

Dois anos depois, fiz minha primeira grande amizade por causa da Legião.
O ápice dessa fase foi aprender Faroeste Caboclo. Foi a primeira vez que escutei (e falei) tanto palavrão. Claramente adquiri fluência com o correr dos anos (entendedores entenderão rs) 

Na adolescência realmente entendi a Legião. Entendi porque senti, por pura identificação. Ouvia Metal Contra as Nuvens e Perfeição, minhas músicas preferidas até hoje, à exaustão.

Mergulhei nas biografias, assisti a cada entrevista, queria saber tudo sobre a banda e seu vocalista. 

E aí o amor pela Legião se tornou amor pelo Renato...Carioca, ariano, ascendente em peixes e lua em áries.
Culto, articulado, politizado. 
Que passou por altos e baixos. 

Ele se tornou a minha referência. 

Cada música tem um significado.
Decorei cada intervenção, cada medley e até as letras erradas de cada disco ao vivo. 

Meu interesse por aprender italiano se deu por causa do Equilíbrio Distante. 

Durante o curso de inglês, gostava de traduzir as músicas do Stonewall Celebration Concert.

Muitos artistas que amo só conheci por causa do Renato (Cowboy Junkies, Nick Drake, Jesus and Mary Chain...) 

Trago na pele os símbolos do seu autógrafo tatuados. 

Fiz amigos que permanecem comigo até hoje por causa da Legião Urbana!

Esse talvez tenha sido o maior presente da banda: me permitir encontrar a MINHA turma por causa da sua música.  

Isso me fez suportar, atravessar. 

E chegar aqui. Hoje. No dia dele, chorando ao tentar fazer caber uma vida inteira num story de 15 segundos. 

Obrigada, Renato Manfredini Jr.
Por me salvar de tudo.
Por me ajudar a criar o meu mundo.
E por todo, todo o resto.

#renatorussovive

sexta-feira, 18 de março de 2022

Eu tinha 12 anos e era proibida de cortar o cabelo.
E, por não poder ir ao cabeleireiro, passei eu mesma a cortá-lo.

Primeiro, apenas as pontas.
Depois, fui cortando mais e mais.
Até arriscar a franja.

Parece uma besteira, mas esse foi o meu primeiro grande ato de coragem.

Guardava os restos mortais numa caixa de lembranças.
Minhas medalhas.

A gente não pode se curvar.

terça-feira, 15 de março de 2022

Caio,

Andei num descompasso com as palavras. Tudo aquilo que eu escrevia não parecia refletir o que eu sentia.
Existe escrita de fachada?
Eu simplesmente não me reconhecia.

Às vezes acho que dediquei muito do meu tempo à escassez. Escrevendo sobre impossibilidades, tecendo versos que não me diziam nada. Elaborando a falta.

Estava à beira da página, pronta para o mergulho fundo, mas eu só boiava.

Medo do naufrágio, medo de ter tragada.

Caio, meu sol é o mesmo que o seu. Como se entregar? A metáfora do dedo na garganta é maravilhosa, mas morro de medo de vomitar.
Isso tem até nome científico: emetofobia.
Ter controle é um engano.
O problema é que eu acredito nessa mentira.

Eu sei que é por pensar demais. Racionalizo o que  sinto e me sinto exausta. Nem nos meus sonhos eu descanso. Acordo em sobressalto. Vivo apressada.

Tenho urgência em chegar. Onde? Eu não sei.

Quem sabe escrever seja um disfarce. A gente constroi um texto para se esconder.

Talvez escrevendo a gente mostre a nossa verdadeira face. Aquela que quase ninguém vê.

Só sei que é preciso coragem.

Por isso é tão difícil, Caio. Cada palavra é uma pedra retirada dos muros que me cercam. Não consigo falar das flores quando por dentro eu carrego desertos.

Escrever é, para mim, uma espécie de espelho. Eu me enxergo vulnerável, fico completamente exposta.
Isso não te apavora?

Mais uma vez caí nas armadilhas que eu mesma te confidenciei.

Por isso, em respeito à folha em branco, silencio.
Reconheço o abismo, fecho os olhos, inspiro.

Esse silêncio vasto precede o salto.
Sei que dentro dele também mora o grito.

sábado, 5 de março de 2022

O universo da menina descalça era o seu quintal.
Ela desbravava o pé de jambo sem medo, com as mãos abraçava os galhos  e dava sempre um jeito de riscar os joelhos. Toda grande aventura deixa uma marca, não seria diferente com a menina descalça.

A vista de lá do alto era muito bonita. Dava pra ver um monte de fios cor de rosa esparramados pelo chão. Flores descabeladas que pareciam um tapete, mas não  limpava os pés borrados de tinta marrom.
A menina era destemida e encorajava a subida do irmão, que resistia.
Ela não sabia o que era solidão, mas sentia.
Muitas vezes apenas escutava o som da própria voz.
Sua melhor companhia.
Era bom estar distraída. Só se dava conta da pressa da tarde quando o sol se escondia sob o canto das cigarras.

A menina que buscava o topo mais alto das árvores descalça.
Ela ainda se incomoda com a prisão dos próprios pés.
Lá no fundo, ela queria ter asas.















quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Definições poéticas


Casa: lugar onde a gente se sente completamente à vontade para transbordar.

Desafio: é se permitir o desconhecido.

Possibilidade: é a recusa do 'não'.

Autoconhecimento: é uma rosa brotando na gente e rasgando tudo por dentro.

Rima: é a coreografia da palavra.

Escrita: palavras andando de mãos dadas.

Cachoeira: é quando o rio se entrega.

sábado, 19 de fevereiro de 2022

"In the dark of night
Those small hours
I drift away
When I'm with you..."


Não lembro exatamente quando a ouvi pela primeira vez. Se durante o expediente, se no ônibus, no trajeto de volta para casa.

Mas lembro que já te amava. E eu não sabia o que fazer com aquele sentimento, com o frio na barriga, com o medo que me tomava o tempo inteiro.

"In the dark of night
By my side
I wish you were
I wish you were"

Tantas dúvidas, receios e anseios, apenas uma certeza: era você quem eu queria. E eu soube desde a primeira vez em que o meu olhar cruzou o seu naquele fim de tarde de terça-feira.

É quase surreal revisitar esses momentos quando escuto a sua voz ou sinto o seu cheiro.

Relembrar uma época em que o que eu mais queria todos os dias era ter você comigo.

Parece mesmo que os sonhos se realizam. 








sexta-feira, 28 de janeiro de 2022



Que o meu olhar seja amoroso e menos crítico
Que as palavras que saem de mim sejam motivo de inspiração e riso
Que eu não me deixe tomar por impulsos de raiva
Que eu aprenda a ter calma
Que eu nunca me esqueça de que ao apontar o dedo para alguém, tenho três apontados para mim
Que eu tenha paciência com meus erros e que eu me orgulhe mais dos meus acertos
Que eu saiba estar presente em ideias e ações
Que eu não seja tomada pela pressa
Que eu respeite os meus limites e aprenda a dizer não
Que eu receba cada pensamento como uma reflexão, não como uma definição
Que eu questione as minhas crenças e ponha em xeque as minhas certezas
Que eu tenha mais humildade
Que eu seja mais resiliente
Que eu lide melhor com tudo aquilo que foge do esperado
Que eu abra mão do controle
Que eu não me compare com ninguém além de mim mesma
Que eu acolha a dor, mas que eu não me apegue a ela
Que eu saiba sentir
Que eu saiba deixar ir
Que eu esteja sempre aberta para o que vem
E que seja sempre para o bem


(Amém)
Eu escrevo para abrir caminhos. 
Cada palavra dita é uma pedra removida dos muros que me circundam.
Cada pensamento que me toma vem inundado da sensação de que perdi muito tempo fugindo. 
Com medo de arriscar um passo além das minhas próprias cercanias.

A vida é vasta, o meu olhar é largo e preciso ver além.
Navegar é preciso
E é só atravessando o desconhecido que saberei mais de mim.