quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Sentada à mesa e nem era de um bar.
Um suco de cupuaçu tomou o lugar da cerveja
Fim de uma tarde que ameaçou chover, mas resistindo, decidiu se ensolarar.
Uma companhia de verdade, disposta a ouvir, a ser e, simplesmente, estar.
Esqueci meu tênis: ela decidiu ir de chinelos só para me acompanhar.
E ainda assim corremos.
O primeiro passo (de muitos) foi dado:
O caminho só se faz ao andar.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Uma página em branco: desconforto é o que sinto.
O silêncio às vezes é mais eloquente que qualquer palavra. Dou uma chance às lágrimas.
E eu me sinto só nessa cidade, perdida numa busca desenfreada pela minha identidade.
No caminho, enxergo apenas abismos
Me ocupo ao máximo para desviar do que sinto
À beira do precipício
Abarrotada de tudo
Quando tudo é um imenso vazio.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Eu escrevia cartas. Fui na contramão, à época do advento da tecnologia. Com a caneta em punho, manifestei minha resistência. Eu lia e era lida.
Confesso que a atual exposição desenfreada de fotos e vídeos me deixa atordoada e perdida. Tenho a impressão de que não dedicamos ao outro a atenção devida, tudo é fugaz, apressado e superficial. E mais, o Ego é alimentado sem controle. Há um desespero por visualizações, comentários e curtidas.

Imagine, dedicar um momento SEU para transpor para o papel sentimentos e pensamentos e depois esperar ansiosamente uma resposta vinda pelas mãos do carteiro...De fato, olho para trás e me pego pensando: faz muito tempo.
Enquanto somos bombardeados por fragmentos esparsos da vida alheia, me questiono, onde foi parar a profundidade nas relações? Onde está a verdadeira essência? Em selfies, filtros, status? Em clichês e frases feitas?

Conhecemos tão pouco um do outro, desaprendemos a admirar as suas singelezas.
(Redes sociais pouco me importam: como é a sua letra?)

domingo, 21 de janeiro de 2018

Reflections of a sunday afternoon

Reclamação sem ação é energia canalizada em vão.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Little Girl Blue

Na casa, pés descalços tocavam o piso de taco, dia nublado. As folhas das árvores formavam um tapete na varanda. Lembro claramente de ouvir cada um dos pingos de chuva.
Ninguém transitava pelas ruas. Estávamos a sós, eu e aquela voz rouca.
Eu apenas me calava, absorta. (Há músicas suas que nunca tive coragem de cantar.)
Em silêncio, refletia sobre aquela letra tão dolorida. E, talvez por isso mesmo, tão minha.
E eu me via sentada, contando os meus dedos, lágrimas rolando, cigarro aceso.
A melancolia de quem foi muito machucada um dia, a tristeza ancorada no peito, a languidez acostumada no olhar.
Lá estava, abraçando os joelhos, abarcando todo o vazio, nó na garganta tão bem atado que matava qualquer possibilidade de palavra.
A ferida ardia e latejava por dentro.
Não havia lugar para a fala: a mágoa me deixava engasgada.
A dor me tomava por inteiro.
Mas eu nunca me senti sozinha.
Eu sabia, Janis: eu também era aquela menina.

"Sit there, ah, go on, go on
And count your fingers
I don't know what else, what else
Honey, have you got to do
And I know how you feel
And I know you ain't got no reason to go on
And I know you feel that you must be through
Oh honey, go on and sit right back down
I want you to count, oh, count your fingers
Ah, my unhappy, my unlucky
And my little, oh, girl blue
I know you're unhappy
Ooh, honey, I know
Baby, I know, just how you feel..."

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Dolores

"Yesterday was cold and bare, 
Because you were not there
Yesterday was cold 
My story has been told..."

Acordei, às pressas, de um pesadelo. Ao abrir as cortinas, deparei-me com o céu cinza, prenúncio de mais um dia típico de chuva nesse mês arrastado.
Até que fui arrebatada pela notícia. O escuro da tarde me invadiu por dentro; fazia tempo que não me sentia tão vazia.
E lembrei de quando escutei sua voz pela primeira vez. E me peguei sentada, aos prantos, debaixo do chuveiro, ouvindo aquele cd. "Something has left my life and I don't know where it went to."
Eu tinha 16. Você, 46.
Sol em virgem, lua em áries e tantos, mas tantos sentimentos que eu jamais consegui expressar com palavras. Então, por pura identificação, eu te escutava. E me sentia acolhida, abraçada, compreendida.
Sem saber, você me salvava.
Você se foi e me dei conta da ferocidade do tempo. E o tempo, apressado e implacável, não para, levando embora, sem avisos, quem um dia significou o mundo pra gente.
Guardo a beleza da sua voz no meu coração e carrego a poesia das suas letras comigo.
Obrigada por ter me feito companhia nos momentos mais difíceis da minha vida.
Ao te ouvir, não me senti mais sozinha.

"And I miss you when you're gone
That is what I do...
And its going to carry on
That is what I knew..."

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Belmonte

A cadeira de balanço na varanda, vovô assistindo tv na sala, a parede repleta de quadros e fotografias.
Acordar bem cedo e ser surpreendida com o cheiro do chá de capim limão fresco, colhido lá do quintal pela minha avó, acompanhado com um bem guardado pacote de bolachas sete capas. " É para minha filha", ela dizia. E prosseguia em seus afazeres, arrastando suas sandálias pela cozinha.
Não demorava muito para chegarem as visitas. Uma tia, um primo, um vizinho.
E ao adentrar aquela porta de alumínio e vidro, era possível ouvir o mais sincero e bonito "bom dia".
A casa quase sempre estava cheia, repleta de vozes, repartidas entre piadas e cantoria, acompanhadas de um violão, amor, risadas e poesia.

Ao anoitecer, o silêncio quase sempre reinava, só se interrompia pelo flanar do vento, pelo som dos carros, pelo barulho das cigarras. Eu, deitada na rede, fechava meus olhos. E contemplava. As luzes da cidade pequena ainda apagadas, as pessoas com suas cadeiras na calçada, tão alheias ao mundo e tão plenas de tudo. Era como sonhar acordada.
Junho era sinônimo de alegria. Alcanço daqui as bandeirolas coloridas que anunciavam as festas juninas. Sinto a madeira queimando, as chamas crepitando, mistura de fogueira com calor humano, me invadindo por dentro, me abraçando. O som da sanfona, zabumba e triângulo, mãos dadas, sorrisos estampados na cara, pés dançando. A música era só mais um pretexto para o encontro. Desconheço melhor descrição para a minha memória que essa: felicidade.
Sim, fui feliz e sabia. Carrego no olfato o cheiro de orvalho, a visão do céu mais estrelado, a pureza da vida simples e por isso mesmo mais rica. Eu vim de lá, do meio do mato.
Meu lar é no interior do sertão.
Trago ancorada no peito essa nostalgia sem jeito que tem até sotaque. 
Daquela casa de número 222, à beira da estrada, parti com muitas lembranças e poucas malas; mas deixei lá, sem pestanejar, um pedaço do meu coração. E muita, mas muita saudade.