quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Retalhos da pandemia

Passei a percebê-lo. Algo tão corriqueiro, apenas nos damos conta de sua importância quando o perdemos. Agora, sinto o quente que ponho pra fora e que embaça meus óculos. Sinto porque paro para observar. 
Inspiro, expiro. 
No meio da crise, reaprendi a respirar. 

*

Máscara fora de época, sem fantasias. Não é disfarce, mas proteção. 
E o que nos resta é encarar o novo mundo com menos sorrisos, com palavras meio abafadas, com mais atenção. Um universo de sentidos que mora no olhar. 
Olhar e ver. Olhar e entender. Olhar e aprender. Olhar e transformar. 

(Textos escritos em meio à quarentena - maio/2020)




Às vezes, me pego pensando se ainda consigo escrever. Elaborar os sentimentos e arranjá-los de um jeito que só eu entenda de verdade, mas que alcance quem (ainda?) me lê.

Tudo é tão rápido. E eu sinto falta de um momento anterior, em que eu era capaz de olhar para dentro com total honestidade, sem rodeios, sem medo.
Porque escrever era, de certa forma, o meu grito de independência. Nada me continha. Eu transbordava.

De vez em quando revisito meus textos. A transparência ainda me assusta. Mas o tempo passa e a gente endurece, ainda que haja aquele ínpeto de procurar a beleza por meio do olhar.

Tem sido raro. A última vez foi assistindo a um documentário no canal Curta. Num ímpeto, pensei: era assim que eu queria viver. Traçando paralelos entre obras literárias, escavando entrelinhas e subtextos, vivendo de palavras. 

Viver de palavras. 
Parece utopia, não é?
Durante muito tempo fiz delas meu amparo, minha estrada.

Preciso voltar para casa.
Por que escrever?
Talvez seja uma pergunta que eu não saiba responder.
Sentir é um hábito. 
Dar vida às palavras é um parto. Tempo para conceber, maturar e trazer à luz.
Difícil. Doloroso, muitas vezes. 

Nos últimos anos, estive no lugar do escapismo, deixando tudo arder, sem me conter, sem refúgio.
Escrever é água de beber, de matar sede. Eu estava no deserto, atravessando a aridez.

Porque a vida só é fecunda com as palavras.

E a chuva sempre vem.