...e, de repente, num impulso, abri meus olhos e amanheci dos meus sonhos. Sentado na minha cama, enquanto, sem querer, um pensamento saiu da minha mente, escorreu da minha boca e se transformou em palavras:
- Eu preciso voltar pra terapia.
Não me surpreendi que isso tenha acontecido, já que essa ideia era fixa e se manifestava com frequência nos lugares mais inusitados: no banho, quando a água escorria corpo abaixo, deitado, vendo tv, lendo um livro, olhando as pessoas na rua, tomando meu café da manhã. Eu poderia facilmente chamar esses pequenos e inúteis acontecimentos de sinais. Já os ignorei à exaustão. É inquestionável, preciso urgentemente voltar para o quarto andar daquele prédio, naquela sala, e fugir imediatamente desse quarto.
Certa vez ouvi ou li, não sei precisar quando, que os adultos são uma mistura de tristezas e fobias. Eu acredito porque sei bem como é. E penso muito sobre isso. Tenho pensado muito no passado, no meu passado, de terceiros também, mas isso aí já é loucura e às vezes ela aprisiona. Estou preso nos meus pensamentos, não consigo expressar o que sinto e estou amortecido, anestesiado, entorpecido. Quase morto, quase uma assombração. E vago por aí, assustando ninguém além de mim. Quase morto, sem sentir. Não parece, mas estou vivo.
Sem rumo, pensei hoje enquanto escovava meus dentes. Perdido, sem objetivos, ideais, com aquela coisa de já ter tentado de tudo e, com a sua licença, mestre Caio, só ter sobrado esse nó no peito. Essa angústia que poderia ser expressa com esse símbolo aqui ó: ?
Eu fui até a sacada do meu apartamento. A vista é bonita, é tudo tão diferente visto de cima. Chove. A nossa mente é tão traiçoeira e traquina que, se você não estiver nas suas condições normais (seja lá o que isso signifique), juro, você pula. Porque a altura te atrai. Quase estende a mão e te convida a saltar. Com o pouco de sanidade que me resta, dei alguns passos para trás. E sentei no chão. E olhei os pingos de chuva que ainda insistiam em cair. Acendi meu cigarro, pensei no passado e gritei:
- EU PRECISO DE TERAPIA.
Mesmo sabendo que ninguém vai ouvir. Mesmo sabendo que ninguém vai me entender.