domingo, 14 de novembro de 2010

Do espelho


Eu não te reconheceria. Aqueles olhos penosos, desconfiados e uma boca que ensaiava um sorriso sem mostrar os dentes, um sorriso contido, uma dispersão aparente. Uma inocência que estava no limite do amadurecimento. Era notória a sua diferença. Era notório que você tinha marcas que estavam estampadas no seu rosto infantil, no seu pequeno corpo, na sua velha alma. Ingênua, tímida, com um ar de tristeza constante.
Eu não te reconheceria. E, à época, certas canções te prendiam, te fixavam e, posteriormente, se tornariam trilha da sua vida. Sempre solitária, sempre quieta, sempre fechada.
Eu não te reconheceria, nem naquelas fotografias, foram tantas mudanças, jamais imaginaria que, de alguma forma, você conseguiria.
Eu não te reconheceria. Se consegui foi por identificação imediata com aquele olhar. Eu me olho no espelho e percebo: algumas coisas nunca mudam, por mais diferentes que por agora pareçam. Posso ter segurança, melhorado minha aparência, crescido de todas as maneiras possíveis, pois de 6 para 20 anos há distorções. O reflexo diverge, mas algo permanece intacto. A incompletude e a solidão ainda me assombram.
Se eu pudesse dizer algo àquela menina que tinha medo de sorrir e de falar, diria que eu estou indo bem, que ela não precisava ter tantas cicatrizes para olhar hoje em dia, porque o tempo trata, a seu modo, de resolver tudo que parece insolucionável. E as piores coisas que te aconteceram durante a sua infância, coisas das quais você se lembra com clareza e que ainda te doem por dentro de uma forma insuportável...Tudo isso te transformou no melhor que você podia ser.
E aquela canção que você ouvia sem muito compreender, ela é verdade, é o mantra da sua vida desde sempre: “ Tudo passa, tudo passará..."

Mas, honestamente, você não precisava se doer tanto.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

En-canto

Eu te olho com olhar desacostumado
Daquele que surpreende ao primeiro contato
E com você eu sinto a leveza do novo
O encantamento é inusitado

Você sequer sabe dessas sensações
Se sabe, não deixa claro
O óbvio não faz parte de você
Não há nada a ser esperado

Eu não sei descrever o que eu sinto
Um amor inexato, indefinido?
Algo ideal e certamente muito bonito
Assim como você, digno de suspiros.

domingo, 7 de novembro de 2010

"So tell that someone that you love
Just what you're thinking of
If tomorrow never comes"
(Garth Brooks)

e tudo é efêmero. A vida é uma passagem, estamos aqui, vivemos, amamos, crescemos e sabemos todos que um dia, sabe-se lá quando, tudo acaba. Fim. The end
Às vezes me pego pensando na morte. Não é um pensamento recorrente, sequer medo, mas uma certa curiosidade. Algo como: morrer dói? Me prendo à sensação. Como é não sentir nada? Seria a morte um estado de entorpecência? Seria a sensação parecida com uma anestesia geral? De repente, você fecha os olhos, não sente absolutamente nada, não lembra de nada, é tão estranho, tão sem sentido, você está vivendo uma vida com toda a energia e, repentinamete, tudo para. Seria morrer uma espécie de vazio? 
Quando cedo alguns momentos da minha vida para pensar na morte, sinto um frio por dentro, talvez a sensação real de um paradoxo, algo pouco palpável, um mistério, de fato. Sabe, houve uma época que eu nem conseguia fechar os olhos de noite temendo a morte. Claro, nunca fantasiei nada como capa preta e foice, mas por não ter controle nem conhecimento sobre isso, sempre, sempre me assombrei com tal possibilidade. Deixar a  vida de lado não estava nos meus planos. Na verdade, creio que ainda não está. Todo mundo se sente imortal durante a vida. Apenas alguém com sérios problemas vive 24 horas do seu dia pensando na iminente possibilidade de ser pego pelo acaso e morrer. Nós vivemos. Corremos dia-a-dia sem pensar nessa hipótese. Sabemos que a hora vai chegar. Mas será que nós aproveitamos enquanto ela não vem?
Cremos ter uma vida na sua infinitude para aproveitarmos. Nós não temos. Morremos todos os dias. A cada dia que passa estamos nos aproximando mais e mais da morte. E não é uma questão de negativismo ou de ser sombrio. Essa é a realidade. Justamente por conta dessa aparente eternidade que nós vivemos, acabamos deixando de lado algumas coisas preciosas, já que nunca se sabe quando seremos surpreendidos pela ausência desse mundo. E por mais que filosofias e músicas estejam sempre ao nosso redor nos lembrando de que a vida é única, de que temos que fazer tudo da melhor forma possível e blá, blá, blá, tem-se a falsa ilusão de que teremos sempre muito tempo. O que nós estamos fazendo nesse ínterim que realmente importa? Eu sempre escutava uma canção que falava para dizermos sempre às pessoas que nós amamos o que sentimos, pois nunca sabemos se o amanhã vai chegar. Verdade verdadeira. Muitas pessoas se arrependem de não terem dito aos seus que os amavam antes que estes partissem. Muitas pessoas se arrependem de não terem tomado uma determinada atitude, decisão ou até mesmo seguido um impulso. Tudo é efêmero.Cada oportunidade que temos na vida é única. A vida é preciosa demais. Deve ser vivida até a última gota. Viver não mata. Faz apenas com que o caminho irreversível para a morte seja mais interessante e incrível.