Eu sonhei com você. Um sonho perturbador, como um quadro de Dalí. Confusão, supresas, metáforas, olhares complacentes que nunca ocorreram em nossas vidas. Tudo era, com o perdão da redundância, muito onírico. Mesmo com o sol na casa seis, a perfeição ainda me incomoda. Prefiro o inacabado e os vazios. Forço a minha mente para lembrar dos detalhes. Sonhei que sonhava que eu tinha um sonho? Algo clariceano sob esse aspecto.
Você me explicava, mas as palavras me soavam como entrelinhas, quase neologismos, mas eu as entendia. Eu refutava numa língua desconhecida e, sem sentido algum, tudo fazia sentido. Você segurava a minha mão, me olhava como se dissesse :"Vai ficar tudo bem, embora haja tanto desencontro...O melhor que você pode fazer é se perder para se encontrar, porque você ainda vai morrer muito nessa vida". Não sei se foi isso o que você quis dizer, assim eu entendi.
Havia um mar imenso, a noite repentinamente se transformara em dia, tons de vermelho e laranja, céu de baunilha, algumas dezenas de estrelas e a lua desaparecendo na linha tênue do horizonte onde a vida ( ou sonho) termina. Sentávamos nas pedras e a sua feição se modificava, como se usasse uma máscara que, a cada hora, era magicamente trocada. Nenhum dos rostos me era familiar e, ainda assim, eu te conhecia. O tom da voz mudava, o cheiro era outro e se confundia com a brisa marítima. Sorri quando você disse que aquele momento iria se eternizar, que mesmo nas perdas, nossos caminhos se encontravam. "Seja como for, você está comigo o tempo todo." O sonho era uma pintura mítica daquela música do Renato. Havia cavalos marinhos, solidão compartilhada, havia aquele aperto no peito e aquele frio por dentro do que chamam saudade. Não sei do quê, não sei porquê. Subitamente, você me abraçava, gritava palavras incompreensíveis que se perdiam vento a fora. Do alto das pedras, nas ondas, ora revoltas, ora passivas que molhavam a areia, você desaparecia. A lua, as estrelas, o horizonte eram tragados pelo mar agitado.E o próprio mar se esvaia. Nada resistia. No nada eu estava sozinha.
No universo de silêncios que me fazia companhia, ouvi uma voz que, do vazio, me dizia: " Levanta e caminha". E eu me perguntava, numa língua impossível de ser falada:
Eu acordava.
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