A tela em branco me assombra. Não consigo compor uma paisagem nessa cidade tão árida. Apenas sinto, guardo cada impressão comigo, quando diariamente às seis horas de tardes eternas saio do meu quarto escuro para ver o sol se pôr; registro a poesia do momento com uma fotografia. Para não deixar a beleza das coisas mais simples esmaecer. Para não endurecer.
Me entrego à pintura do crepúsculo como se todas as cores ali dispostas pudessem preencher as escalas em cinza da rotina. Não é por falta de amor, signo e significado dos meus dias. Me falta pertencer, desacostumar o meu olhar. Não consegui estabelecer uma conexão real com esse lugar. Há muita superficialidade nas relações e absolutamente tudo me espanta. É horrível admitir, mas não foi difícil me isolar. Jamais estive tão próxima a mim,
apesar do desencontro com as palavras.
Ainda não consegui ocupar essa cidade.
Não criei raízes nesse chão:
Me sinto escassa.
Sou uma estrangeira que trouxe consigo apenas o vazio de uma mala extraviada.
O resto é solidão.